terça-feira, 1 de abril de 2008

Fina estirpe

Craque? Não, longe disso. Apenas um desses raros corredores de coração imenso, cujo instinto está acima de graves impedimentos físicos. Da estirpe de um Boticão de Ouro, por exemplo, que, prestes a vencer um grande prêmio, tentou cruzar o disco com fratura exposta.

Jurado era um desses gigantes das pistas, guardadas as devidas proporções. Correndo dos dois aos sete anos, quando ainda não existiam por aqui as facilidades de enturmação dos claimings, esse filho de Coarazito e Jurée conseguiu o espantoso cartel de 23 vitórias, cinco em Cidade Jardim, 7 no Tarumã e 11 em São Vicente, estas últimas praticamente consecutivas e uma delas em tempo recorde para os 1.100 metros. Detalhe: Jurado tinha os sesamóideos fraturados desde a estréia nas pistas. Uma lesão grave e irrecuperável, já que esses frágeis ossinhos, na base dos boletos dianteiros, é que absorvem todo o impacto de um galão.

Seu treinador na Pista Prateada, José Faurer, sempre teve a paciência necessária para lidar com as necessidades especiais do neto de Coaraze. Talvez por isso ele tenha obtido tantas vitórias. Uma dessas necessidades era que o animal precisava ficar deitado por três ou quatro dias, em repouso, sendo alimentado em cochos improvisados, até que, superadas as dores, ele se sentisse em condições de ficar de pé e praticamente “exigir” do seu cavalariço que o levasse para a beira da raia para gramear e corcovear. Outra era que só entrasse na raia para correr.

A coragem, porém, tem seus limites. As fraturas acabaram falando mais alto, sendo chegada a hora de encaminhar o campeão para uma justa e confortável aposentadoria. Acabou vendido a preço de banana para um sitiante de Itapecerica da Serra para servir de garanhão. Pena que tenha durado muito pouco, apenas alguns meses a nova e boa vida de Jurado. Por obra e graça de uma traiçoeira jararaca. Um triste fim, na verdade, para um corredor de fina estirpe.

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